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segunda-feira, 04 março 2019 17:45

Entrevista ao CICV: situação humanitária na Venezuela

Entrevista a Sophie Orr, Diretora Regional do Comité Internacional da Cruz Vermelha para as Américas

1. Qual é a situação humanitária na Venezuela?

A situação tem sido complexa durante muitos meses devido a vários fatores: crise económica, manifestações de cunho social, deterioração dos serviços básicos, fluxos migratórios e altos índices de violência. Desde Janeiro, a renovada crise política e o aumento na violência agravaram o quadro, colocando em risco os frágeis mecanismos para lidar com a situação e os recursos limitados da população. Os desafios para manter o sistema de saúde em funcionamento e para reparar a infra-estrutura, por exemplo, estão a ter um impacto nos mais vulneráveis e na população em geral.

Como consequência, as pessoas continuam a deixar o país. Normalmente, quem sustenta a família deixa-a para trás, iniciando um caminho incerto e perigoso na esperança de encontrar um modo de ganhar dinheiro, seja nas áreas fronteiras da Venezuela ou nos países vizinhos. Os que ficam precisam de muito apoio. As crianças abandonam a escola porque as mães não as podem alimentar, ou simplesmente porque os professores se foram embora. Em alguns casos, estas vão para as ruas, tentando sobreviver desesperadamente, expondo-se a situações piores.

2. Quais são as atividades do CICV no país?

Aumentamos, neste ano, a nossa assistência às pessoas necessitadas, em particular nas áreas de saúde e saneamento. De fato, mais que dobramos o nosso orçamento, de aproximadamente 9 milhões de francos suíços a 19 milhões.

Continuaremos a capacitar as equipas de saúde para atendimentos de emergência, doando remédios e equipamento hospitalar e reformando estabelecimentos de saúde pública. Esperamos visitar locais de detenção e prestar apoio aos detidos e às autoridades penitenciárias. É vital trabalhar para manter os serviços públicos básicos junto às instituições públicas, de forma não política, para garantir que as pessoas mais afetadas sejam assistidas e que a população em geral tenha acesso aos serviços quando necessitem.

No ano passado, apoiamos vários hospitais com a entrega de material médico, melhorando os serviços de emergência, capacitando as equipas e auxiliando com a atualização de protocolos. Atendemos milhares de pessoas doentes e feridas por armas e realizamos formação em primeiros socorros para as equipas de primeira resposta.

Em relação ao fluxo contínuo de migração, também ofereceremos apoio aos migrantes mais vulneráveis durante o seu trajeto, aos que se mudaram para países vizinhos e às famílias que ficaram na Venezuela.

Continuaremos, do mesmo modo, o nosso apoio e o trabalho com a Cruz Vermelha Venezuelana e com diferentes parceiros da sociedade civil.

3. Qual a posição da organização a respeito da distribuição de ajuda proposta para a Venezuela? O CICV participará dela?

É importante que mais ajuda chegue à população necessitada da Venezuela. Este é o motivo pelo qual o CICV está a aumentar a sua resposta humanitária no país. A nossa única preocupação é assegurar que as pessoas mais afetadas sejam assistidas da melhor maneira possível.

Estamos prontos para levar ajuda humanitária à Venezuela desde que todas as partes interessadas concordem com o papel do CICV e da Cruz Vermelha, que está baseado estritamente nas necessidades, e que a ajuda seja prestada a todas as pessoas que a precisem com a total imparcialidade.

Continuaremos a trabalhar através dos nossos canais normais para levar assistência de acordo com os nossos princípios de neutralidade, imparcialidade e independência. Não entraremos em discussões políticas.

Segundo a nossa experiência de trabalhar em diferentes lugares de alta complexidade, sabemos que a postura de neutralidade do CICV tem os seus resultados, já que permite às nossas equipas no terreno ter acesso à população afetada e responder às necessidades, ao mesmo tempo que lembramos a todas as partes envolvidas que esta é a prioridade.

4. Com quem têm diálogo na Venezuela?

Como em todos os lugares onde o CICV trabalha, estamos em contato com todas as partes interessadas, para assegurar que seja criado um ambiente em que possamos realizar a nossa ação humanitária. Na Venezuela, encontramo-nos com todos os atores pertinentes.

5. Enfrentam limitações para realizar a ação humanitária no país?

Estamos presentes na Venezuela desde 1966 e podemos desempenhar as nossas atividades atualmente. Estamos a levar a assistência necessária e, neste ano, estamos a duplicar a nossa resposta, incluindo um aumento das nossas equipas. Estamos presentes no terreno e temos acesso irrestrito aos locais onde identificamos ser necessária a nossa resposta humanitária. Gostaríamos de ter um acesso maior aos locais de detenção no país e esperamos que isso aconteça em breve.

Onde quer que trabalhemos, é sempre importante que seja concedido às organizações humanitárias o acesso irrestrito à população necessitada.

6. Há uma crise migratória da América do Sul?

A situação na Venezuela provocou a migração de três milhões de pessoas, segundo os dados da ONU. Além dos números, o CICV está preocupado com a vulnerabilidade desses migrantes. Uma pessoa ou uma família com poucos recursos, que faz uma longa viagem a pé, normalmente precisa de muito apoio.

Estamos particularmente preocupados com a situação dos migrantes que cruzam a fronteira com a Colômbia através de rotas irregulares. A presença de grupos armados significa que os migrantes enfrentam extorsão, ameaças, violência ou recrutamento forçado. As mulheres e menores desacompanhados são particularmente vulneráveis, sendo a violência sexual um perigo real.

Na Venezuela, algumas crianças são deixadas para trás aos cuidados dos membros idosos das famílias, ou simplesmente deixadas numa situação altamente vulnerável. O êxodo está a afetar as capacidades locais em todos os setores – professores, médicos, trabalhadores sociais e mesmo voluntários da Cruz Vermelha deixaram o país – agravando, por sua vez, a situação e complicando a possibilidade de uma pronta recuperação.

Neste ano, aumentamos a nossa resposta na Colômbia em 6,4 milhões de francos suíços para permitir aos migrantes o acesso aos serviços médicos, saúde mental e apoio psicossocial e reabilitação física. No ano passado, mais de 100 mil migrantes venezuelanos puderam falar com os seus familiares mediante o serviço telefónico oferecido pelo CICV na Colômbia, Equador e Brasil. Também providenciamos água e saneamento, reestruturamos alguns abrigos e doamos remédios aos hospitais na fronteira com a Colômbia. Na Venezuela, o CICV prestou apoio ao retorno dos restos mortais de venezuelanos aos seus familiares e ajudou a reunificar famílias. Também estabeleceu serviços de contato em cinco pontos diferentes ao longo do caminho.

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